Quando falamos de alimentos como o peixe, e seus ácidos graxos tipo ômega-3, a maior parte das pessoas tende a pensar neles como uma espécie de “super alimentos, super saudáveis”.
São tantos benefícios ligados ao óleo de peixe, e tão baixo risco em consumi-lo, que fica fácil entender o fascínio com este nutriente.
Dentre os supostos benefícios, temos que o óleo de peixe:
- ajuda a combater a inflamação,
- melhora a saúde do coração, e mesmo
- pode prevenir o declínio cognitivo.
Parece até “bom demais para ser verdade”.
Mas será que é verdade mesmo?
Conforme você vai ver nos próximos minutos, existe uma grande diferença entre “comer o peixe” e “tomar um suplemento de óleo de peixe”.
Mas primeiro, vamos mergulhar na principal de todas essas alegações: a ideia de que o óleo de peixe seria incrivelmente positivo para a saúde do coração.
Essa ideia é propagada inclusive pela AHA (American Heart Association, ou Associação Americana do Coração), que sugere que consumamos uma certa quantidade de óleo de peixe todos os dias.
No entanto, aqui vai a parte mais interessante: estudos e levantamentos científicos mostraram que menos de 10% das pessoas ingerem a quantidade suficiente recomendada.
A solução mais óbvia, para isso, seria a de simplesmente consumir um suplemento alimentar. Porém, nem tudo é tão simples.
Em primeiro lugar, porque poucos suplementos trazem na sua “dosagem padrão” a quantidade adequada de ômega-3: um levantamento mostrou que apenas 9% dos suplementos avaliados forneciam a quantidade certa de DHA e EPA combinados.
DHA e EPA são os tipos mais úteis e biodisponíveis de ômega-3. Os nomes por extenso desses ácidos graxos são Ácido Docosahexaenoico (DHA) e Ácido Eicosapentaenóico (EPA).
Esses dois óleos específicos são conhecidos por seus benefícios para a saúde e, juntos, você desejaria cerca de 2 gramas deles.
No entanto, muitos suplementos comercializados fornecem quantidades absurdamente inferiores de EPA e DHA. As marcas de suplementos estão economizando justamente nos componentes mais essenciais.
Mas, mesmo se você achar um suplemento que esteja com as quantidades corretas, temos mais notícias preocupantes.
Porque os estudos têm mostrado que os ácidos graxos ômega-3 são fantásticos no combate às doenças cardiovasculares.
Mas qual é o problema?
O problema é que a maioria desses estudos examinou pessoas que estavam obtendo esses ácidos graxos diretamente de sua dieta — isto é, comendo os peixes em si.
E os efeitos de suplementar ômega-3 não parecem ser os mesmos de comer peixes.
Isso ficou evidente em um estudo extenso com mais de 15.000 participantes.
Aqueles que tomaram óleo de peixe não tiveram uma proteção cardíaca melhor do que aqueles que não o fizeram.
Sendo que não estamos falando de apenas um único estudo.
O American College of Cardiology apontou outro estudo envolvendo 12.000 pessoas observadas por até sete anos.
O resultado? Não houve benefícios significativos dos suplementos de óleo de peixe.
Outro estudo com pessoas que tomaram uma dose mais alta de óleo de peixe por dois anos inteiros encontrou a mesma coisa: em comparação com seus colegas que não tomaram óleo de peixe, eles não tiveram melhora na saúde cardíaca.
Então, isso significa que comer peixe é a chave mágica?
Bem, a pesquisa indica que se você comer peixe, digamos, cerca de duas ou mais porções por semana, pode ajudar a proteger contra doenças cardiovasculares.
E os efeitos benéficos não são compensados ao você tomar pílulas ou suplementos de óleo de peixe.
Antes de descartarmos completamente os suplementos de óleo de peixe, é importante notar que eles não são completamente inúteis.
Eles podem ter outros benefícios potenciais para a saúde, como ajudar a combater a inflamação, reduzir os triglicerídeos naturalmente e potencialmente contribuir para a saúde ocular e cerebral à medida que envelhecemos.
No entanto, se você está procurando o pacote completo de benefícios para a saúde, parece que a melhor opção é ir com mais frequência à seção de frutos do mar, ou à peixaria, e optar pela alternativa mais óbvia e saudável: comer comida de verdade.
Se você por algum motivo não come peixes (por exemplo, se é uma pessoa em dieta vegetariana), você pode considerar outras fontes, como sementes de chia, sementes de linhaça, nozes, edamame e mesmo algas marinhas.
(Elas são menos biodisponíveis do que os peixes, mas são melhores do que suplementos — e bem melhores do que não comer nada.)
De toda forma, o principal ponto é o seguinte: embora o óleo de peixe esteja em destaque por seus benefícios para a saúde há anos, é importante entender qual a real capacidade desse suplemento — e quais suas limitações.
Neste caso, para uma melhor saúde cardíaca, prefira comer peixes gordurosos como sardinhas, salmão ou cavala uma ou duas vezes por semana — gaste seu suado dinheirinho comprando comida de verdade, pouco processada, e deixe o suplemento para quem, por um motivo ou por outro, não pode comer peixes ou frutos do mar.
Referencias
- Assadourian JN, Peterson ED, McDonald SA, Gupta A, Navar AM. Health Claims and Doses of Fish Oil Supplements in the US. JAMA Cardiol. Published online August 23, 2023. doi:10.1001/jamacardio.2023.2424
- ASCEND Study Collaborative Group; Bowman L, Mafham M, Wallendszus K, Stevens W, Buck G, Barton J, Murphy K, Aung T, Haynes R, Cox J, Murawska A, Young A, Lay M, Chen F, Sammons E, Waters E, Adler A, Bodansky J, Farmer A, McPherson R, Neil A, Simpson D, Peto R, Baigent C, Collins R, Parish S, Armitage J. Effects of n-3 Fatty Acid Supplements in Diabetes Mellitus. N Engl J Med. 2018 Oct 18;379(16):1540-1550. doi: 10.1056/NEJMoa1804989. Epub 2018 Aug 26. PMID: 30146932.